24 julho 2011

Absurdo Tolo

DELÍRIOS ESCREVINHADOS

Desci as escadas até ao topo e apaguei a luz, para não tropeçar nos móveis do corredor vazio.

No quarto ao fundo, o avô entrevado seguia pela rádio o final cor de fogo de E Tudo o Vento Levou.

Sentei-me à sua frente, peguei no jornal e comecei a ler baixinho as legendas, porque o velhote era surdo e precisava sempre que alguém o ajudasse a juntar as sílabas.

Mal eu tinha começado, o avô deu um salto:

-  Grande novidade!... Porcaria de filme!... Tanta fama, tanta fama... E um gajo aqui a perder tempo...!

Lançou-me um olhar traquinas, e desafiou, falando-me quase ao nariz:

- Vai um joguinho de dominó? Ah...? Ou de cartas? Aposto que te perco!

- Sempre quero ver isso... – acedi eu, só para o contrariar.

Enquanto ele foi num instante buscar o piano de cauda à sala, eu fui baralhando as partituras, para ele distribuir jogo assim que voltasse.

Sentámo-nos os três a ensaiar uns arpejos. O avô tocava um doble-quinas e eu acompanhava, soprando de vez em quando pela palheta do baralho, a fazer vibrar o ás de copas.

Quando engoli a palheta e caí com sentidos, quadrado no tecto, o avô levantou-se num ápice e exclamou, eufórico:

- Tás a ver!? Eu bem disse que te perdia!

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