30 junho 2006

Longínqua Coerência

 Num país longínquo, o Ministro ameaçou-o:

- Se for como eu quero, a tua carreira passa a depender do sucesso dos teus alunos e da opinião dos pais deles.

Caiu o Carmo e a Trindade. Que não, que nem pensar, que não podia ser, que isso era um atentado à sua dignidade profissional, que o Ministro não respeitava ninguém, que era só o que faltava, não se pensar na qualidade do ensino, atentar contra a essência da profissão, esvaziá-la de sentido..., passar-se os alunos sem eles saberem nada... onde é que já se viu? Só por cima do cadáver dele!

Um mês depois, usou os seus poderes legais de pedagogo para aprovar a progressão de um aluno, que ele próprio, professor, tinha contribuído para reprovar, dois dias antes, com várias, muitas negativas. Decidiu assim contra a sua própria decisão, sem que novos dados tivessem surgido, a não ser o parecer do Encarregado de Educação, contrário à reprovação.

Enquanto isso, o Ministro pensava se havia de cumprir a ameaça ou dar ouvidos ao indignado protesto dele.

Não consigo sair da idade das perguntas:

Quem é que o obrigou a cumprir uma lei que ainda não existia?
Quem é que ele desautorizou e desrespeitou, para além de si próprio?
De que é que ele teve medo, ou de quem?
Que imagem deu de si, dos seus colegas, e da organização a que pertencia?
Que benefício pessoal e/ou profissional terá retirado desta atitude?
Que alcance humano, pedagógico e social terá tido esta prática?
Que vantagens terá trazido ao aluno este voo sem pára-quedas?

Seja como for, ainda bem que esta história se passou num país longínquo!
Em Portugal, nenhum professor seria capaz de uma coisa destas...

29 junho 2006

Garagens Privadas, Estacionamentos Públicos

 Ando eu a queixar-me de não passar da idade dos porquês...



Hoje, ao fim da tarde, fiquei bloqueada à saída da garagem colectiva do meu prédio. Vivo no centro de Cerromaior, numa zona de muito difícil estacionamento.
Quando tentei sair, encontrei um veículo branquinho e simpático, com os dois piscas ligados, que estava bem estacionado precisamente no único sítio por onde eu podia sair, ou seja, em frente ao portão. Fiquei ali, "pendurada", com duas rodas já no passeio, outras duas ainda na rampa, e o focinho do carro quase encostado ao branquinho gozão.
Esperei uns segundos, mas como não havia ninguém no carro, não me valeu de nada. Recuei, para descer novamente a rampa, e saí a pé da garagem, à procura do legítimo condutor do branquinho. Entrei na loja contígua, indaguei do proprietário do veículo... olhei para todo o lado... e nada! Nem sinais de condutor com ar de infractor!
Regressei à garagem (fiz os possíveis por não olhar para os piscas que não desistiam de me chamar estúpida), voltei a subir a rampa com o carro, recoloquei-o na tal posição estratégica, e fiz ouvir o protesto através da minha buzina. Acordei certamente o vizinho, que trabalha por turnos; atraí rostos mais ou menos curiosos a quase todas as janelas dos prédios do quarteirão... mas do "chofer" do branquinho nem sinais!
Até que, quando eu própria já tinha vergonha da minha buzina, aparece uma lady, ligeiramente apressada, bamboleando a mala a tiracolo; sorriu para o ar, em direcção ao outro lado da rua, olhou-me de soslaio, de chave na mão, e lá tirou o branquinho da minha trajectória. Nem um pedido de desculpa, verbal ou apenas mímico, nem nada. Seguiu o seu caminho, como se eu ali não estivesse, certamente desagradada pelo incómodo que lhe causei.
Mais do que furiosa, pela situação em si, e por me ter calado (lembrei-me do comentário da Maria...) segui viagem, olhando para o atraso que o relógio se preparava para me marcar. Se não fosse a minha mania de sair sempre mais cedo do que o necessário, teria chegado tarde ao que tinha a fazer, 150 quilómetros mais adiante.

E agora, volto aos meus porquês.

Porque é que tive justamente de sair àquela hora?
- porque tinha como objectivo principal impedir a senhora de governar a vida dela.

Porque é que não pedi desculpa à senhora?
- porque sou mal educada e incapaz de reconhecer a incivilidade que pratiquei.

Porque é que me pus a buzinar, incomodando toda a gente?
- porque não respeito os direitos dos outros, nem as regras de vida em sociedade, nem o código da estrada.

Porque é que não fiquei em casa?
-porque há pessoas que têm sempre de fazer o que querem e lhes apetece, sem pensarem nos outros.

Porque é que insisto em usar a garagem, se às vezes até se consegue estacionar no exterior do prédio?
- porque me quero "armar em boa", e rebaixar os outros, mostrando que eu tenho garagem, e eles não.

27 junho 2006

Prazos, Marcações e Horários

 Porque é que se marca uma reunião para as 9 e só se começa às 9.30?

- porque o pequeno-almoço é sagrado, ninguém marca falta e ninguém ousa reclamar.

Porque é que se dá um prazo até amanhã, e depois pode ser no dia seguinte?
- porque como ninguém cumpre as regras, o melhor é ser flexível, para não nos chatearem a cabeça.

Porque é que se falta a compromissos estabelecidos com colegas de trabalho, e não se tem o cuidado de avisar a abécula que fica à espera?
- porque se acha que a um colega não é preciso dar satisfações, e o respeito não é coisa para ter com os amigos. Quanto mais próximos, maior é a desconsideração.
Porque é que se marcam consultas a que se sabe antecipadamente que não se vai, e não se desiste atempadamente, para dar lugar a outro?
- porque quando se quer a consulta, a recepcionista dá sempre um jeitinho, e não é preciso pensar pelos outros, que esperam meses.
Porque é que temos de gramar duas horas de "sala de espera" pela consulta a que chegámos antes da hora marcada?
- Porque ninguém assume que os doentes não podem ser todos vistos ao mesmo tempo, e atender uma pessoa em cinco minutos, e 12 numa hora, é pura ficção com que se iludem as estatísticas.

Porque é que se atendem telemóveis durante uma reunião?
-porque não se respeita o local em que se está, nem o lugar que se ocupa, nem a instituição que nos acolhe, nem as pessoas que nos rodeiam.

Porque é que quando fazemos uma encomenda chega tudo num instante, e depois esperamos séculos pela mercadoria?
- porque o que interessa é agarrar o cliente,e logo se inventa uma desculpa e se chama mau cumpridor a alguém que não pode defender-se.

Não consigo ultrapassar a idade dos porquês!
Alguém sabe como é que isto se trata?

26 junho 2006

Portugal contra Todos

Apesar do meu contentamento de adepta da selecção nacional de futebol, acho que o alvo principal de um futebolista deve ser a baliza do adversário e não as suas canelas ou pés, por isso não gostei muito da exibição de Portugal, ontem à noite.

É evidente que o árbitro não vale a água que bebe, mas quem iniciou a batalha campal não foi ele!A "nossa" equipa não jogou grande coisa, foi muito faltista, e o Figo - que é um senhor -desiludiu-me ao desaparafusar-se.

A falta de nível do Costinha não me desilude, porque nunca me iludiu.

As lágrimas do Cristiano Ronaldo não me impressionaram, porque ele chorou apenas com pena de si próprio e do seu ego ferido por não poder exibir-se mais um bocadinho.

A atitude amuada de Nuno Gomes, no final do jogo, mostra a sua dificuldade em lidar com a frustração de não jogar.

A estrelinha da sorte, que tantas vezes nos queixamos de não nos acompanhar, esteve do nosso lado, e o resto é conversa.

Quanto aos holandeses, tiveram um azar proporcional às oportunidades, que foram muitas.

Conseguimos transformar uma fraca exibição num feito histórico, e elevar uma equipa esforçada e desesperada à categoria de deuses.

Mas não se pode dizer que Portugal foi brilhante.

A prova disso obtém-se com o seguinte exercício de imaginação:

- O que estaríamos a dizer hoje da selecção portuguesa se os holandeses tivessem conseguido marcar golo numa daquelas situações de baliza aberta, com a defesa a apanhar bonés e o Ricardo a ver a bola passar?

O nosso problema é que quando perdemos, tudo é mau, e quando ganhamos, tudo é perfeito!

Assim, é raro e difícil aprendermos alguma coisa com o que a experiência tem para nos ensinar...

Fora de tristezas, o que é que eu espero para o próximo sábado?

No mínimo, que aqueles mânfios comam a relva para ganharem à Inglaterra! Porque é a relva que devem comer, e não os adversários!

25 junho 2006

Argentina contra Eles

Custou, mas foi!

Contra um árbitro inventor de fora-de-jogo inexistente, a Argentina está nos quartos de final!

Com uma arbitragem justa, os 90 minutos teriam bastado para resolver o jogo. Com o golo anulado, foi sofrer mais um pouco...

Agora, é só arranjar forças para correr com os alemães!

Estou farta do ego dos “grandes” países europeus!

Também não terei pena nenhuma se a França voltar para casa cedo!

Quanto ao serão de amanhã, e a fazer fé no Borda d'Água, valha-nos S.Próspero, com muito sumo de laranja!

24 junho 2006

Fogo de Artifício

Nós, portugueses, temos um triste defeito: achar que o que vem de fora é que é bom, só porque vem de fora.

Compararmo-nos com outros povos só vale a pena se for para aprendermos com eles o que têm de melhor.

Não me importava que tivéssemos o rigor alemão, a pontualidade britânica, ou o pragmatismo irlandês; que produzíssemos como os luxemburgueses ou tivéssemos o civismo dos escandinavos.

Infelizmente, a nossa propensão para a superficialidade leva-nos a invejar o nível de vida dos outros, mas a rejeitar mudanças de hábitos (profissionais e de vida) que nos conduzam ao nível deles .

É sempre mais fácil dizer mal de tudo, como se o país que somos fosse assim uma espécie de entidade abstracta, e não o resultado do que cada um dos seus cidadãos é e faz .

Lembrei-me deste assunto, porque ontem à noite assisti, pela TV, a um dos mais deslumbrantes espectáculos de fogo de artifício de que tenho memória – o do S.João, no Porto – e tenho a certeza de que vi apenas uma ínfima parte daquilo que a multidão teve o privilégio de ver ao vivo!

Tenho orgulho que Portugal seja um dos maiores e mais criativos produtores mundiais de material pirotécnico - que exportamos para o mundo inteiro - e que nesta área haja pouco quem nos chegue aos calcanhares! A maior parte dos países europeus não sabe o que é um fogo de artifício deste nível.

Em contrapartida, também fiquei a pensar que talvez esta situação seja a metáfora do país que somos.

O fogo de artifício é lindo mas é caro, dura pouco e, quando acaba, regressa o silêncio e a mais profunda escuridão.

Foi assim com a Expo 98 e com o Europeu de Futebol.

Assim será com o Mundial de Futebol.

Mais dia, menos dia, havemos de voltar ao escuro e ao silêncio.

23 junho 2006

Lágrimas

 Estou convicta de que aqueles que nos contrariam não são, necessariamente, nossos inimigos; bem pelo contrário.

Tenho mais medo dos que vão dizendo que sim a tudo, mas sempre à espreita da primeira oportunidade para atacarem ou condenarem.

Vem isto a propósito das reacções dos jovens perante discussões frontais, em que se marca oposição a uma ideia ou a uma proposta.
Por exemplo, o que os leva a chorar, quando são contrariados?

- mostrar fragilidade, esperando que parem de os arreliar?
- expor insegurança, na expectativa de que tenham pena deles?
- desnudar sensibilidade, na convicção de que gostarão mais deles assim?
- escancarar impotência, na esperança de que não lhes exijam mais nada?
- escapar ao confronto com as fraquezas, criando complexos de culpa nos que contrariam?
- sacudir a humilhação?
- mostrar orgulho ferido?
- dar voz a infantilidade, imaturidade?
- confessar impotência?
- suplicar misericórdia?
- deixar falar complexos de inferioridade?
- abrir os poros do cansaço, do desgaste, do stress?
- expulsar a raiva, a fúria, a vontade de gritar?

Em qualquer dos casos, é sempre dar demasiada importância à situação, e valorizar o que ela pode ter de mais negativo.
Trata-se de um comportamento exclusivo da juventude... ou há adultos iguaizinhos?

22 junho 2006

Dilemas

 Calar ou falar.

Agradar ou exasperar.
Incomodar apenas ou irritar mesmo.
Cinzentar ou arriscar.
Falar ao ouvido ou dizer em voz alta.
Mandar recado ou ser directo.
Ignorar ou envolver-se.
Encolher os ombros ou afirmar.
Fugir ou enfrentar.
"Ser ou não ser?" - Eis a questão.

Fingir não pensar é boa estratégia existencial?
Será confortável ficar em silêncio, de braços caídos, à espera que passem tempestades, dias, anos, uma vida?
Os que optam por nunca dizer o que pensam serão mais felizes?

17 junho 2006

A Bola É Redonda e a Argentina É Que Sabe!

 A bola é redonda e a Argentina é que sabe!

Ó meus amigos!

Tirei o som à televisão, para não ouvir os comentários do "Engenheiro Boleiro" Humberto Coelho; ele, que foi o maior treinador de todos os tempos, no campeonato do mundo do "Faz-de-Conta-Que-És-Muita-Bom", vem agora torturar-me os ouvidos! Não há paciência!!! Pensam que a gente não tem imagem, na televisão? Relatam como se estivessemos a ouvir rádio!

Portugal ganhou, sim senhor, e daí?

Jogou melhor do que contra Angola? Não era difícil! Mas não fez uma exibição de encher o olho, não galvanizou ninguém a não ser os portugas, e está longe de valer, como conjunto, a soma das vedetas individuais que saltitam no relvado.

O Irão teve um azar dos diabos, porque as balizas são pequenas e a pontaria não esteve grande coisa, mas o Ricardinho bem pareceu ter pena deles, quando nos deixou a apanhar bonés...

A minha dúvida é esta:

O que fará a nossa selecção contra os avançados da Argentina, que jogam verdadeiramente em equipa, esperam para ver quem está em melhor posição para marcar, e depois disparam, imparáveis? Sim, porque o objectivo do jogo não é só trocar a bola, pois não? Ainda é marcar golos, não é?

Eu, que até nem engraço com a Argentina (desde a mão de Maradona) estou a deslumbrar-me!

Aquilo é futebol!

Se quiserem, levem o Pauleta para suplente, e o Cristiano Ronaldo para aprendiz! Deixem-nos só o Figo, que é cada vez mais um senhor, no meio daquele umbiguismo de gente que está ali só para se mostrar!

Talvez contra a Holanda nos safemos.

Mas ainda vamos ter muito que sofrer, ai vamos, vamos!